Deixando a casa, preferi tomar um táxi por ser mais confortável e não precisar me preocupar com o estacionamento para o carro.Subi as escadas do viaduto da Praça XV com toda a elegância e descontração, observando as pessoas que, como eu, iriam fazer o trajeto.Comprei o ingresso para o Catamarães com facilidade, pois não sendo final de semana, mesmo em época de férias, tudo fica tranqüilo. Não esperei muito pela barca, deu tempo de ir ao banheiro e de tomar um refrigerante. Aprecio tudo nesses passeios pela Baía de Guanabara. Até a loja de souvenires ganha um aspecto diferente aos meus olhos.A barca, imensa, chega imponente e seu apito, avisando a chegada, é como música ritmada com minha expectativa. Entro e logo vou à proa – tenho mania de me fotografar na frente, ao vento, com os cabelos em desalinho. Já lá dentro, escolho o lugar para sentar-me e acomodo minha pequena bagagem no banco ao lado. Tenciono lá permanecer apenas por umas quatro horas, razão pela qual dispus-me a trazer apenas um leve casaco e lenços de papel especiais para suportar a coriza que a aproximação do mar me provoca. Observo os vendedores ambulantes que várias vezes ao dia fazem o mesmo trajeto. Do vendedor de sorvetes e biscoitos ao de bijuterias, todos percorrem automaticamente o início e o fim da barca, em busca de compradores que diminuam o peso de suas bagagens, revertendo-as em ganho para o seu sustento.Escolho um brinco colorido com uma pequena pena azul na ponta para combinar com a calça e túnica esvoaçantes e de cor azul piscina com que estou vestida. Não deixo de comprar, também, um pacote de biscoito Globo salgado que venho saboreando em silêncio, ao mesmo tempo em que desfruto a beleza da paisagem. Noto que meus companheiros de viagem são os tipos mais diferenciados.Na minha frente duas adolescentes papeiam agitadas e sem a preocupação de que outros as escutem, falam de suas experiências amorosas sem qualquer pudor. Uma senhora franzina, de cerca de setenta anos, sentada do lado direito das duas, mostra-se incomodada com a conversa e abre e fecha a revista que tenciona ler, com gestos ríspidos de quem não gosta do que escuta. Do outro lado, à minha esquerda, um grupo com quatro estrangeiros fotografa e filma toda a Baía, não contendo gritinhos de admiração com a beleza ao redor.Um senhor em cadeira de rodas amparado pela filha, pouco atrás de mim, pergunta insistente e repetidamente sobre o horário da consulta médica. Outra senhora, com dificuldade, vai remando ao balanço da embarcação e passa por nós em busca do banheiro. Lá na frente, um casal de namorados, alheio a tudo e a todos, não percebe a hora da descida e é preciso ser chamado pelo fiscal.Após o apito anunciando nossa chegada à Ilha, vamos todos em fila indiana, num percurso de cores e cadências, atingir o outro lado, onde o trenzinho local, as charretes, bicicletas e outros ambulantes encontram-se a nossa espera.Passo por todos e dirijo-me à Igreja de São Roque, bem na entrada da Ilha, imponente na sua simplicidade, parecendo receber a mim, exclusivamente, de braços abertos.Cumpro meu ritual de visita e calmamente, seguindo a paz do local, faço minhas orações.Aqui estou eu, novamente em Paquetá. Embora estejamos no verão, o dia não está muito quente. O Sol observa a paisagem de longe e fica indeciso de se mostrar. Sento num dos bancos de madeira maciça embaixo de um coqueiro milenar e fixo na mente a natureza plena. Compro uma garrafa de água mineral numa das carrocinhas de ambulantes que circunda a praça e volto ao banco para terminar de saborear meu biscoito Globo. Refestelo-me com o ar, com o barulho das ondas batendo no mar calmo.Decido alugar uma charrete para reviver meus passeios de infância, sem deixar de fora nenhum local.O condutor, sem querer saber se lá estive outras vezes, cumpre a rotina que lhe ensinaram e anuncia cada passagem, no ritmo da puxada dos burros. Passamos pelo Museu de Artes, pela Casa de José Bonifácio, pela Academia de Letras, pela Pedra da Moreninha e pela árvore O Baobá, originária da África, chamada Maria Gorda. Aí peço ao condutor da charrete que pare por uns segundos e abraço aquela árvore com dificuldade, pois de tronco tão largo, parece nos engolir no toque. Todo o percurso é coberto por flamboyant. O Parque Darke de Matos parece nos tirar desse mundo levando-nos a distâncias não imaginadas por entre árvores de todos os tipos. Uma delas parece conter, no tronco, uma casa, onde não posso deixar de entrar e admirar o outro lado do parque que termina no mar. Só essa experiência de descobertas já vale o passeio.Resolvo tomar o trenzinho para ir ao Mirante, no Morro da Cruz, e apreciar, serenamente, a vista parcial da Ilha. De repente, dou de cara com dois sagüis, típicos da região. Filmo sua fugida, como coisa preciosa nas minhas recordações. Já lá se vão quase duas horas e meu estômago anseia por alimento. Prefiro um sanduíche de dois andares ao almoço tradicional, pois assim posso, após um breve descanso, alugar uma bicicleta Monark de pneu balão e por, pelo menos duas horas, sentir o sabor dos meus passeios à tardinha na rua em que morava quando tinha quatorze anos.
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