Judith vinha caminhando lentamente pela rua movimentada. No rosto, uma expressão de cansaço, de quem tinha lutado o dia inteiro e sabia que ainda até o cair da noite, teria muitas coisas a fazer. Sabia que os três filhos a esperavam para o jantar, sabia que a casa, como sempre, necessitaria de uma organizada e que ainda teria que estender no varal as roupas que o marido, antes de sair para o trabalho - pois o seu turno era noturno - havia colocado na máquina de lavar.
As pessoas passavam por Judith e estranhavam sua calma aparente, visto que todas naquele percurso, corriam praticamente. Tinham ânsia de chegar ao local para onde iam. Fosse sua própria casa ou algum outro lugar. Mas Judith não. Caminhava sem pressa, com o olhar fixo no vazio. Passava diariamente por aquele local e era, a essa altura, uma autômata. Na sua mente revivia a vida vivida até ali. Quantos sonhos havia deixado para trás quando escolheu para seu marido, o Gilberto. Gostava de sua alegria, de sua forma carinhosa de ver a vida, de seu sentimentalismo em excesso. Lembrava do dia em que ele às três da manhã, quando retornava do trabalho, trazia nos braços um cãozinho faminto, encontrado na esquina de casa, choramingando. Lembrava de sua felicidade extasiante no nascimento dos filhos, de suas promessas aos mesmos pelo vidro do berçário de que a eles, nada faltaria, tivesse ele que morrer por cada um.
Lembrava de como os anos, agora já dez passados, foram exterminando de sua personalidade com as dificuldades diárias, aquele sorriso aberto, aquela confiança no amanhã, aquela certeza de que tudo seria melhor no dia seguinte.
Lembrava de quantas vezes nesses anos todos, o encontrou chorando escondido no banheiro, vendo-a partir para a batalha da sobrevivência. Por mais que Judith tentasse mostrar-lhe que não era sacrifício partilhar com ele a criação dos filhos, Gilberto não se convencia de sua obrigação em fazê-lo sozinho, pelo menos no terreno financeiro.
E assim vinha Judith pela rua, pensando, pensando.... De repente viu diante dos olhos o Joaquim, seu primeiro amor, um sonho de criança. Ele não estava ali e ela sequer sabia como se lembrou dele naquela hora, mas sentiu aos quarenta anos, com todo o fervor, o sangue percorrer-lhe as entranhas, quente e rápido, como a proclamar a vida!
Fonte da imagem: espelhoconsciente.blogspot.com
Diza,
ResponderExcluirMuito tocante essa história tão real que mostra que mesmo quando a luta pela sobrevivência é árida por demais e solapa os sonhos mais cândidos, ainda assim, uma lembrança ou mesmo algo que seja apenas fruto de nossa imaginação pode ser capaz de alvoroçar a alma e despertar a vida que dormitava no fundo de nosso ser.
Belo texto. Parabéns!Beijo.
17 de Outubro de 2009 20:30
Alba,
ResponderExcluirmais belo ainda é o seu comentário.
obrigada,
bjs.Diza